Arte transforma cidades em galerias

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Hoje, o preconceito diante de manifestações artísticas em centros urbanos dá lugar à admiração 

Intervenções urbanas consistem em movimentos artísticos que se desenvolvem em espaços públicos e se relacionam com a manifestação visual, alterando, assim, o cenário cinza das cidades. Um movimento que começou sendo tachado de “vandalismo”, ganha hoje as ruas das grandes cidades do Brasil e do mundo, promovendo acesso direto à arte, independente de burocracias, instituições culturais ou galerias fechadas.
O Notícias do Jardim São Remo entrevistou Eduardo Kobra (37), um dos mais conceituados grafiteiros de São Paulo, com mais de 50 painéis pintados pela cidade, além de desenhos em cidades como Nova York e Los Angeles. Kobra explica que, a princípio, iniciou-se como pixador: desconhecia a possibilidade de poder desenhar nos muros, só entrando em contato com essa nova forma de expressão quando viu imagens em outros países. Quando tinha cerca de 15 anos começou, e depois nunca mais parou.
Apesar de hoje vermos com certa naturalidade e até admiração os desenhos nos muros das ruas, nem sempre foi assim. Kobra conta que sofreu preconceito de sua família, e foi até retido pela polícia por três vezes. Por ser algo que era novo em sua época, as pessoas “associavam diretamente ao vandalismo”, conta.

O grafite hoje
Atualmente a mudança na forma que a sociedade encara o grafite é bastante diferente do que se via antes. Artistas recebem apoio do governo, além de poderem ter até mesmo patrocínio para pintar, com pouca burocracia. Porém não é assim em todo lugar. São Paulo ganha destaque por essa facilidade do artista em poder deixar sua marca, precisando somente da autorização do proprietário do muro que deseja, o que abre espaço para uma diversidade artistíca que pode ser observada por toda a cidade. Kobra justifica essa diversidade dizendo: “tem gente que só tinha trabalhos em galeria, e começou a colocar na rua também”. Porém em alguns dos maiores centros urbanos mundiais, essa facilidade já não é vista, o propritário do muro em cidades como Londres, por exemplo, não tem direito de autorizar a pintura.
Quando questionado se todo grafite (ou street art) é feito a partir da ideia de mandar uma mensagem para todos que irão ver, Kobra diz que não. Afirma que aquilo que é pintado depende mais do gosto de quem o faz: “a rua hoje é muito similar à galeria. O artista tem a linguagem dele, tem o pensamento dele (…) e desenha, pinta dentro de uma galeria, e hoje também faz na rua”. Ressalva que existem sim aqueles que pensam na mensagem, talvez não em todas as obras, mas algumas. Citando a si mesmo como exemplo, conta que possui desde obras que marcam seu estilo até, por exemplo, uma crítica a tourada em um desenho seu na avenida Brigadeiro Faria Lima.
Apesar dos aspectos positivos da arte de rua, Kobra conta também sobre os riscos. Ele, que sofre de intoxicação por metais pesados devido ao uso contínuo do spray, alerta ainda sobre outros fatores de risco da profissão: “não só nesse aspecto (da toxicidade da tinta), mas pintar com escada, em cima de andaime na lateral de um prédio… tem toda uma segurança envolvida nisso, não é uma coisa tão simples”.
Além dos riscos envolvendo a profissão, Kobra fala também sobre como é passageiro aquilo que se desenha nos muros: “na rua não existe garantia que o trabalho vai permanecer”, devido as mudanças constantes que ocorrem nas cidades. Acrescenta dizendo que já foi pintar sabendo da possibilidade da sua arte não permanecer ali, e considera de certa forma natural. Porém, apesar dos diversos pontos contrários, completa dizendo: “eu me realizo de ter chegado lá e feito aquele trabalho e não sei quanto tempo vai ficar, eu tiro minha foto e pra mim aquele momento já valeu a pena”.

Por Ana Luisa Abdalla

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